quarta-feira, 1 de outubro de 2014

MATÉRIA DO G1 SOBRE EX PACIENTES QUE RETORNARAM AO ANTIGO HOSPITAL

Matéria do G1 feita pela Paula Paiva Paula

http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/09/apos-20-anos-ex-funcionarios-voltam-hospital-em-sp-e-visitam-exposicao.html



Sr Baía, antes quando trabalhava no Hospital e agora na exposição


Após 20 anos, ex-funcionários voltam a hospital em SP e visitam exposição

'Made by... Feito por brasileiros', reúne artistas no antigo hospital Matarazzo.
G1 convidou enfermeira e 'faz-tudo' a voltar ao local na região central de SP
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Assim que cruzou a entrada do hospital Matarazzo, Seu Baía, como é conhecido, lembrou imediatamente do dia em que o local ficou em polvorosa pela "morte" do ator Lima Duarte. “Foi um corre-corre aqui para passar com ele na maca”, lembra. O hospital, desativado em 1993, marcou São Paulo, a vida de meio milhão de paulistanos que nasceram em sua maternidade e chegou até a servir de cenário da gravação de uma novela.
Vinte anos se passaram desde que José Baía de Lima – que é paraibano, apesar do sobrenome – esteve pela última vez no prédio onde trabalhou por mais de três décadas. Mas ele ainda lembra exatamente onde ficava cada ala do hospital na Bela Vista (região central de SP), que hoje abriga a exposição de arte contemporânea "Made By... Feito por Brasileiros", que vai até o dia 12 de outubro.
Boas lembranças também tem a enfermeira Nilda Renil dos Santos Dias, de 54 anos, que trabalhou por 14 anos na ala de pediatria. Ambos aceitaram o convite do G1 de retornar ao hospital com um objetivo em comum: matar saudades e ver seu antigo espaço de trabalho ocupado por arte contemporânea. A área do hospital, construído em 1904, tem 27 mil metros quadrados.
Seu Baía chegou a São Paulo em 1961, com 22 anos. Trabalhou na construção do Museu de Arte de São Paulo (Masp) e, em seguida, virou auxiliar de serviços gerais no hospital. Lá, construiu não só sua carreira profissional, como encontrou Adélia, sua esposa há mais de 40 anos. “Dei minha contribuição com muito amor e ainda encontrei o amor”, conta.
Eles se conheceram em 1970, quando a enfermeira chegou de Marília, no interior do estado, e logo chamou a atenção de Seu Baía. “Ele ia tomar injeção só pra me ver”, conta Dona Adélia, hoje com 71 anos. Seu Baía assumiu que tomava as injeções de vitamina só para ficar perto da pretendente, mas diz que ela também buscava motivos para ir vê-lo na contabilidade. “Convencido!”, chama a atenção a esposa. O casal teve três três filhos, um deles nascido no Matarazzo, e dois netos.
Quando foi "faz tudo" do hospital, entre 1961 e 1964, Seu Baía teve contato com outros pacientes ilustres – esses internados de verdade –, como José Mauro de Vasconcelos, autor do livro “Meu pé de laranja lima”, para quem serviu café. Mesmo trabalhando na área de serviços gerais, o uniforme era um avental todo branco, “porque o hospital era administrado pelas freiras”, explica.
De auxiliar, ele foi para a secretaria, onde era o correspondente ao atual office-boy, conta. Continuou crescendo e foi para a contabilidade. Quando deixou o hospital, era funcionário da auditoria. Todas essas áreas ficam no local onde hoje na exposição estão os desenhos feitos por homens da tribo Warli, localizada no leste da Índia, a 150 km de Mumbai.
A sala onde Nilda trabalhou por mais tempo recebia os bebês que vinham de pequenas cirurgias. Tinha cinco berços e a sua mesa. Os pacientes geralmente entravam e saíam no mesmo dia. Atualmente, a sala recebe uma obra do carioca Daniel Senise, que fez um restauro parcial da sala: metade dela com um quadrado restaurado na parte antiga e o mesmo espaço deixado sem restauro na outra metade, criando um efeito espelhado.
Nilda foi enfermeira do Matarazzo até o hospital fechar, em 1993. Ali permaneceu mais um ano acampada com outros funcionários, na esperança de que o local fosse reaberto. Uma das lembranças mais tristes que ela tem é do dia em que fizeram a transferência de todos os pacientes. “Quando trouxeram todas as ambulâncias para transferir os pacientes da maternidade, todos os funcionários choraram muito. Não fomos avisados”, recorda.
Na única sala onde ficavam os bebês que vinham de cirurgias cardíacas, estão imagens de santos corroídos, do artista Rodrigo Bueno. No local ficavam 20 berços, segundo Nilda. No espaço interno da ala B, onde hoje as pessoas podem ver a produção do francês Xavier Veilhan, que tem a proposta de brincar com luz e sobra, eram realizadas as festas da pediatria. “Que saudade! Se você pudesse entrar na minha mente...”, suspira a enfermeira.
Após o fechamento do hospital, Nilda tentou visitar o lugar outras vezes, sem sucesso. “Implorei para entrar e não deixaram”. Agora, 20 anos depois, ela pode mostrar para o filho único, Felipe, de 25 e nascido no Matarazzo, cada cantinho do lugar que dedicou anos de trabalho.
Após o fim da mostra, o local poderá dar lugar a um projeto do grupo francês Allard. Estão previstos um hotel de luxo, uma galeria de lojas e restaurantes e um "Centro de Criatividade", que incluirá salas de cinema, estúdios de produção para filmes, música e arte, espaço para o desenvolvimento de artesanato e moda. Falta aprovação da prefeitura.
Corredores de lembranças
Ao caminhar pelos corredores da exposição, cada espaço traz uma lembrança. Seu Baía conta que o lugar que hoje abriga a instalação toda em neon do americano Kenny Scharf era o maior e mais caro quarto do hospital. Na entrada de um corredor, Adélia aponta e diz que ali foi operada para a retirada das amígdalas. Nesse local, a mineira Cinthia Marcelle fez uma intervenção no piso do corredor com a poeira reunida do hospital.
Ao chegarem aos pés da escada onde está o busto de Ermelino Matarazzo, as memórias dos dois ex-funcionários do hospital se conectam. Tanto Nilda quanto Seu Baía recordam da mesma história. O médico Archimedes e a enfermeira Lourdes eram noivos. Ela teve um problema com a anestesia em uma cirurgia e ficou paraplégica. Eles não chegaram a se casar, mas o médico cuidou de Lourdes até o final de sua vida. O quarto de um ficava do lado direito da escada, e o do outro do lado esquerdo.
“Achei muito bonito, fiquei feliz de ter vindo aqui', conta Seu Baía sobre o antigo hospital transformado em galeria de arte temporariamente. No entanto, ele considera que o espaço poderia ter um destino diferente do que o espera – um hotel de luxo, galerias de lojas e restaurantes, e um espaço para exposições.
“Acho que os proprietários poderiam, em memória dos fundadores, fazer pelo menos um postinho de saúde, para ajudar os mais necessitados e condizer com a história do hospital”, diz.
Nilda disse que achou que as obras de arte teriam relação com o espaço do hospital. Ao ver um vídeo-retrato de um homem segurando caixas de ovos onde ficava o lactário – local que as enfermeiras pegavam as mamadeiras – dispara: “Ele poderia estar segurando uma mamadeira”.
A enfermeira, que hoje trabalha em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) de Diadema, disse não compreender algumas obras de arte contemporâneas. “Hoje eu aprendi a fazer obra de arte”, brinca. “Eu vim realmente para matar as saudades”.


Um comentário:

pauloaltro@hotmail.com disse...

ola, é possível filmar no lugar?